Era tão boa a vidinha no campo...







terça-feira, 1 de dezembro de 2009

Tamos aqui tamos no Natali...estórias do mê Alegrete

Hoje acordei no meio da palha.
As maganas das vacas andavam nervosas…
Isto quando se aproxima o natal não há quem as segure…é que nunca se sabe qual delas será a escolhida para bufar o menino
A Hirondina, a mais velha e boa vaca leiteira, meteu na cornamenta que deveria ser a eleita, a Miquelina, a mais nova e ainda pouco dada aos leites, achou que era hora das novas oportunidades e gerou-se uma confusão que nem o Tónio, o boi do mê monti, as conseguiu separar.
Aquilo estava num reboliço tali que lá tive que ir de manta e almofada a druimiri pra junto delas.
Ao acordar estava um frio de rachar a alma, olhi pra elas como quem nem acredita que ainda passasse pla cabecinha de alguma ir servir de aquecimento ao menino….por mim não iriam ter carta de recomendação não senhori.
Sai dali deixando bem claro que não queria voltar a meter-me entre elas, olhi pró Tónio com um olhar cúmplice ao qual ele respondeu com um raspar de casco no chão e lá fui a veri como estaria o resto da bicheza.
Ao sair do estábulo o dia ainda nem clareava o suficiente e catrapum, tropeci numa coisinha arredondada, tal quali um bolego da ribêra…mas só deu pra veri que nam era quando ao ser alvo do mê encalhanço proferiu um glu glu muito aflito e dasatou a correr à minha frente.
Esfregui os zolhos, mais que uma vez como devem calcular, custou-me a acreditar que os bolegos andassem e fizessem Glu glu…..pari e griti-lhe:
-Alto lá !
-Alto lá!!! (gosto de repetir as ordem)
Pare já disse!! plos vistos não há mesmo duas sem três…
E o magano parou, ficou-me a olhar com uns zolhos muito assustados e a fazer um glu glu muito aflitivo. Foi ai eu vi claramente que se tratava de um dos meus perus mais gordos e afanados, meio doido é certo mas nunca antes se fizera passar por um bolego.
Ohh Alfredo Alfredo (disse-lhe eu com voz austera e firme que só eu sei fazer quando nem sei bem o que quero dizer a seguir)
E ele olhava-me com ar envergonhado, até me pareceu que corou.
Ohhhhhhhh Alfredo Alfredo !! repeti novamente para ver se me dava tempo a ter alguma coisinha que dizer.
Ospois lembri-me, estávamos quase no natal e o mê Alfredo estava simplesmente a tentar fugir da triste sina de ser ceia na consoada de alguém.
Ai que até se me vieram as lágrimas aos zolhos! Afaguei o bicho e em voz já mais meiguinha (sim, também sei fazer vozes dessas volta e meia…) prometi-lhe que nem que me dessem o valor de 3 perus como ele eu o venderia para tal fim.
Levanti-me e esperava ver uma reacção por parte do bicho mas nada, olhou pra mim com aqueles mesmos zolhos de peru em vésperas de Natal, fez mais um Glu Glu e voltou a fazer de bolego no meio do caminho do monti.
Bahhhhhhhh pinsei eu, encolhi os ombros e segui caminho fora.
Mas quanto mais andava mais pensava no que estava a acontecer no mê Alegrete mal chegara o mês de Dezembro.
Agora entendia o motivo que levava o mê galo Jacinto andar a cantar fora de horas e com uns cócórócócós mais esganiçados enquanto as galinhas pareciam ficar de joelhos à sua volta… afinal tinha tudo uma razão!
Continui caminho e só pari na casa do Ti Zéi, encontrei-o a olhar pró pinheiro, nem sei bem aos anos que aquele pinheiro estava ali plantado…plantado literalmente plantado..plantado metaforicamente plantado também sim senhori.
Oh Ti Zéi atão que se passa homi?
Mas ele nem me disse bundia nem nada, continuou a olhar a olhar e ao mesmo tempo passava a mão plo tronco do pinheiro…é nestas alturas que entendo porque há alguns a que se chamam mansos.
Ti Zéi!!!!!!
Ai cumadri vocei desculpe, estava aqui a pinsar na vida é o que éi. Disse-me ele sem sequer olhar pra mim.
Pois cumpadri eu até entendo, a vida dá-nos muito que pensar sim sr. mas diga-me lá homi, que se passa hoje que nam se passe amanhãe e que possa pensar depois?
Sabe cumadri, estou com um dilema ei o que ei.
Di queim?
Di lema cumadri.
Ai compadri nam me diga!!!
Ai compadri vocei nam me diga!!
Já disse cumadri…já disse.
Olhi-o pra veri se ele se explicava melhor e como tali nam aconteceu chegui-me à frente.
Agarri-o plos ombros e disse:
Força compadri, nam se deixe ir a baixo homi, sabe que já ouvi dizer que os médicos já operam tudo e se nam for cá é no estrangeiro. E sabe que pode sempre contar cá com a cumadri pró bom e pró mau que aparecer compadri.
E estando eu a fazer o que pensava ser o mê deveri, como comadri e amiga de longa data (nunca entendi porque raio há datas assim, deve ser por mondi uns meses terem mais dias que outros ou assim..) bem, dizia eu que estava a animar o mê compadri por mondi o seu Dilema quando ele olhou pra mim com cara de que nem me estava a escutar bem e disse:
Cumadri, vocei já fez a 4ª á noite nam foi?
Hummmm
Hummmmmmmmmmmmmmm
Disse eu.
Sim cumadri, dilema é um lema em duplicado melher…quer-se dizer. Tenho que escolher um e nam sei qual, é o que ei.
Nam estava a gostar nada da sensação de não saber que raio era aquela coisa que o mê compadri falava e pra nam variar muito fingi que entendia do assunto.
Ora compadri, escolha o que dê menos trabalho de fazeri.
Respondi convencida que ficávamos por ali na conversa.
O Ti Zei olhou-me, desta vez tirando a mão do tronco do pinheiro (foi aqui eu vi que tinha um machado na outra…e nam sei bem porquê di um passo atrás e fiz um sorriso de orelha a orelha disfarçando os nervos)
Ele deu um passo na minha direcção, eu dei outro pra trás e quando estava mesmo mesmo a agarrar as saias pra largar a fugiri ele disse-me:
Cumadri Marizei, nam sei se lhe corte os ramos e diga “O Natali sem pinheiro nam ei Natali” ou nam corte nada e diga “Natali pra ser Natali ao pinheiro nam faças mali” tá a entenderi cumadri?
Ainda pensi ser sincera mas resolvi responder que sim…nam fosse a doença dar-lhe prá violência como eu já estava a suspeitari.
Afinal aquilo do Dilema era mais grave do que eu imaginara…coitado do homi, que o viu e quem o vê!!
Deus há-de ser grande e fazer com que a ciência encontre cura pra esta maleita a tempo.
Acabi por deixa-lo e corri direitinha à igreja onde sabia encontrar sempre a Ti miséria, ora a limpar a sacristia ora a juntar as misérias dos outros, em sacos com donativos prós pobrezinhos.
Mal a vi ela acenou-me de contente, é sempre bom sentir que ainda há quem goste de nos veri..só a Miséria mesmo pra ser sempre tam boa comigo.
Aceni-lhe também e senti-me num dos bancos de trás a esperar que ela viesse ter comigo. Tinha que falari com ela para por fim a tanta confusão no monti.
Nam tardou e veio sentar-se junto a mim, fazendo aqueles gestos na cara e sempre de frente pró altari, nunca entendi beim porque raio ela fazia aquilo mas achava-lhe uma certa graça e nam lhe pregunti nada…cada um com as sus coisas pois então.
Mal se sentou, logo de seguida se ajoelhou, ainda pensi que lhe tinha caído alguma coisa ou que ia continuar nas limpezas da igreja, asseada que só visto a minha cumadri Miséria.
Mas plos vistos engani-mi, de joelhos e de mãos postas, baixou a cabeça e começou a falari remoendo pra dentro palavras que nam lhe consegui entender nadinha.
Foi então que fiz o mesmo, sempre ouvi dizer que nos devemos juntar a eles quando com eles nam podemos..e embora magra, a cumadri era melher de peso que eu sabia.
Já de joelhos e de mãos postas arrepari que nam tinha o mê aneli..mau! terei deixado o dito no canteiro da Salsa quando fui veri onde raio paravam as modas logo de manhã?
Depois teria que lá voltari, se fosse o caso e com a sorte que tenho, anda estaria no mesmo sitio onde me caíra….é sempre assim, até quando deito o milho aos porcos, no outro dia ainda lá está todo.
Estava com estes pinsamentos quando a cumadri Miséria me pergunta entre dentes pró que venho.
Disfarci a voz tambeim, nam fosse alguém alem do senhori nos ouviri e disse-lhe:
Cumadri miséria, algo muito sério se passa no Alegrete. Só a cumadri me podi a judari..
Olhi-a mas ela continuava a rezar com muita fé, tanta tanta que até franzia os zolhos e via a força com que apertava as mãos…ainda me pareceu ouvir algo parecido com “ainda meu deus o que será desta vez?’”…mas deve ter sido impressão minha que a cumadri já me disse que de Deus nam espera respostas…bem, levanti-me e olhando pra ela disse:
Cumadri, preciso que me ajude a esconder o menino!!
Disse e senti-me, e foi ai que vi que a igreja estava cheia e o sr. Prior tinha parado de dizer a missa, olhavam-me todos com uma cara de poucos amigos…e por momentos senti o peso da fé nos meus ombros…ajoelhi!
Nesse momento a Ti miséria só dizia baixinho…disfarce comadri, disfarce por favori e reze, reze muito.
Pai Nosso, Ave Maria…Ave Maria, Pai Nosso…é sempre a mesma coisa, das canções só me lembra dos titalus!!!
Uffff

1 comentário:

  1. Para mim só haveria um lema e não um di...

    “Natali pra ser Natali ao pinheiro nam faças mali”! E mai nada :)

    Além dos títulos também sei a musica a letra é que se me escapa aqui e ali.
    Beijinho.

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cavadelas